terça-feira, 30 de dezembro de 2008

O filme do ano

"Batman - o cavaleiro das trevas" é uma das mais recentes provas de que o cinema (inclusive o cinema americano, tão habituado a emplacar sucessos nas telas brasileiras) pode provocar inquietações e suscitar questões que estimulem o pensamento. Sim, nesse novo "Batman" ainda estão os carrões, as gostosas, as piadas-clichê e os efeitos especiais que arrancam suspiros. Mas salta aos olhos do espectador a perturbação que seus personagens transbordam pela tela. Quem é mesmo o vilão da história? E o mocinho, é mesmo tão herói quanto aparenta? O interesse individual pode, em algum momento, se sobrepor ao interesse coletivo em uma sociedade "justa"? Os fins justificam os meios? Em meio a tantas perguntas sem resposta, questões que nem uma vida inteira pode responder de maneira incontestável, o personagem do promotor Harvey Dent simboliza a dualidade pela qual vários personagens passam no filme. Batman rastreando todos os celulares da cidade para encontrar o Coringa, no melhor estilo George W. Bush; um criminoso da pior espécie toma uma atitude que os "homens de bem" não foram capazes e joga o detonador de uma bomba pela janela da barca, enquanto os "cidadãos" exemplares em outra barca exigem o acionamento do detonador; policiais a serviço do crime e um "vilão" que queima o dinheiro sujo obtido pela máfia. No olho do furacão, uma mente brilhante e doentia instaura o caos na cidade, ou apresenta idéias libertárias? Difícil tirar conclusões nesse filme, certo mesmo é que o Batman realmente não é um herói nem o Coringa um vilão, ambos são um espelho que refletem não valores como justiça e violência, mas sim atitudes politicamente incorretas, porém eficazes. Eles demonstram, assim como o Duas Caras, como a linha que separa o bem e o mal é estreita. Se equilibrar nessa linha é a justiça, algo muito difícil de conseguir. Como dito no filme, as pessoas poderosas ou vivem pouco e morrem como heróis ou vivem muito até se tornarem vilãos. "O cavaleiro das trevas" retoma uma característica imprescindível aos meios de comunicação, os questionamentos, sem para isso abrir mão do entretenimento, e por essa razão o considero o melhor filme do ano.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Injustiças do futebol (ou a torcida que não merece o time que tem)

Desta vez não quero falar do meu Santos. O momento me priva de demonstrar com a devida intensidade todo a prazer e orgulho que torcer pelo peixe me proporciona. Não sou daquele tipo de torcedor que vai sempre ao estádio. Isso tem suas vantagens e desvantagens. Por exemplo, por ir pouco, posso me gabar de estar "invicto" quando vou aos estádios. Por outro lado, sinto falta das emoções que só uma arquibancada insandecida pode oferecer. Tenho muita consideração por torcedores que têm a chance de acompanhar o time do coração na maioria dos jogos da temporada. E não me refiro à torcida organizada, mas ao torcedor comum, o verdadeiro torcedor, aquele que está com o time na alegria e na tristeza, na saúde e na doença. Principalmente, na tristeza. Costumo dizer que é fácil ser santista quando vencemos um clássico, ou quando conseguimos um título. Difícil é quando o time passa por momentos complicados. Deve ser meio bizarro, mas eu mesmo só uso camisas do meu peixe quando o time perdeu no dia anterior, ou antes da partida, justamente pelo que acabei de falar. Torcedor oportunista é que nem político em época de campanha: só aparece na hora "H". No Brasil, há torcidas fantásticas, que realmente empurram o time, mas o time nem sempre está à altura da paixão do torcedor. Um caso clássico, na minha opinião, é do Atlético-MG, que tem uma das torcidas mais apaixonadas do Brasil, mas vê, em pleno centenário do clube, um time que não ganhou nada, nem mesmo chegou à disputa de finais. Quero citar apenas mais 2 torcidas: as maiores do país, Flamengo e Corinthians. Sem dúvidas, 2 torcidas que amam seus clubes. A primeira é capaz de transformar um gigantesco Maracanã em um caldeirão digno dos estádios mais acanhados; a segunda, acompanha o time sempre, nos piores ou melhores momentos. Mas os times talvez não correspondam a toda essa "devoção". O Flamengo patina no BR-08 e vive de títulos estaduais há algum tempo; o Corinthians, rebaixado em 2007, disputou a segunda divisão em 2008. Poderia continuar aqui citando exemplos. Mas existe uma torcida que não merece o time que tem. Veja só: o time é frequentemente citado como o mais organizado do país, possui o maior estádio privado do Brasil, tem média de 1 título por ano nas últimas temporadas, monta sempre times no mínimo competitivos, tem, disparado, o melhor técnico do país, uma diretoria competente, e não é costume ter presidentes que se acham o dono do clube. Apesar de tudo isso, a média de público desse time em seus 16 primeiros jogos do BR-08 foi de 12 mil, mas foi superior a 55 mil nas 2 últimas partidas, agora que o time assumiu a liderança do campeonato, há 5 rodadas do final. Curioso que o mesmo ocorreu em anos anteriores. E de 2 semanas pra cá, fui inundado com e-mais de torcedores desse time exaltando sua equipe. Sem contar o evidente aumento de circulação de camisas desse clube pelas ruas de SP. É uma pena pra esse time (não para eu, que já me acostumei com isso) que, entre tantas qualidades, não consiga fidelizar seu torcedor, não consiga tornar a terceira maior torcida do país um pouco mais companheira, pois os momentos de tristeza um dia chegarão, esses chegam para todos...
O futebol é realmente injusto...ainda bem! Pois se não fosse assim, não seria o maior esporte do mundo, o mais apaixonante, o mais idolatrado e inexplicável. Sem a imprevisibilidade, o futebol seria mais um esporte comum, e é essa sua insistência em rejeitar os obviedades que o torna tão atraente. É por isso que umas torcidas têm mais alegrias que tristezas, mesmo muitas vezes não sendo tão merecedoras delas... Pode ser apenas inveja de minha parte, mas pode ser também uma constatação. Parabéns pelo hexa, agora só faltam 2 para igualar o octa do nosso alvinegro praiano.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Surge um herói no esporte

O GP do Brasil de F1 de 2008 já entrou para a história. Uma das corridas mais emocionantes dos últimos tempos, não contente em decidir o campeão da temporada, o fez nos últimos metros, com uma emoção digna de uma partida de futebol. Felipe Massa, desde os treinos livres, demonstrou sua superioridade em Interlagos, e na corrida liderou o tempo intiero, fazendo a sua parte e vencendo a prova. Restava então torcer, como fizeram os milhões de brasileiros pelo país. E o Brasil acreditou que era possível. E Massa acreditou que era possível. E o país torceu como há tempos não fazia. Mas o destino foi caprichoso e, a 2 voltas do fim, colocou na boca dos brasileiros o gosto de ter um campeão mundial novamente. Mas, a 2 curvas do final, recolocou o título nas mãos do inglês Lewis Hamilton. Um brasileiro venceu no Brasil, mas o sentimento era de derrota. Difícil compreender esses momentos, onde a vitória parece não ser suficiente. Mas o que se viu vai além de um título mundial ou de uma vitória. Pois quando se percebe toda a dedicação e, principalmente, o orgulho de representar o seu país, estamos diante de um herói do esporte. E o Brasil é muito carente de ídolos em esportes individuais. Talvez o último grande nome tenha sido Guga, no tênis. Mas Felipe Massa agora entra para esse time. Mostrou competência, serenidade, vontade, solidariedade e ousadia quando necessário. Brilhou tanto quanto o campeão. Nos mostrou a dignidade e a beleza que um vice-campeonato pode ter. E nos encheu de esperanças de ver o Brasil novamente com um campeão mundial na F1 nos próximos anos. Por ora, um orgulhoso segundo lugar. E um novo herói esportivo. Parabéns, Felipe Massa!

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Bem-vindo de volta!

2002 foi um ano inesquecível para o futebol brasileiro. A seleção foi à Copa desacreditada e voltou como pentacampeã mundial. A confiança do torcedor estava reestabelecida. O Brasil foi campeão, retomou a hegemonia no futebol, mas ainda assim faltava o talento e a magia que se espera sempre do futebol brasileiro. E então teve início o campeonato brasileiro. Ao fim de 2002, o país teve uma grata surpresa: o futebol-arte estava de volta. Com um bando de moleques aparentemente despreocupados, o Santos foi de candidato ao rebaixamento a heptacampeão nacional. E o melhor: encantando o torcedor com um futebol tipicamente brasileiro. Muitos lembram-se das 8 pedaladas de Robinho na final do campeonato contra o Corinthians, mas acreditem: a maior exibição de futebol-arte da última década ocorreu 2 semanas antes, no dia 01 de dezembro de 2002. Pelas semifinais, o Santos enfrentava o Grêmio na Vila Belmiro. A partida terminou 3 a 0 para o Santos, mas o resultado era irrelevante diante do que se viu: uma aula de futebol-arte (não que essas coisas possam ser ensinadas), um espetáculo digno dos anos 60, quando o mesmo Santos encantou o mundo e parou guerras. Ao assistir a essa partida, enfim entendi porque o Brasil é o país do futebol. Não, não é porque somos os maiores campeões em copas do mundo, nem porque sempre tivemos equipes competitivas ou fomos a todas as copas. É porque, ao contrário do mundo, onde a busca pelo resultado é a prioridade, aqui a prioridade é o futebol-arte, jogar bonito é obrigação, e então como consequência os resultados aparecem. O Santos, que junto com o Botafogo foi o guardião do futebol-arte nos anos 60, o resgatou em 2002. Novamente um time todo de branco liderado em campo por um garoto negro encantava o mundo, novamente esse time mostrava que é possível sorrir no futebol, até mesmo para um técnico com fama de mal-humorado. O futebol-arte voltou! Para os mais velhos, foi a chance de reviver e se emocionar de novo com uma fagulha daquilo que era abundante nos nos 60. Para os mais jovens que, como eu, não viveram aquela época, foi a chance de ver ao menos 5% do que já foi o futebol brasileiro. E assim entender porque somos o país do futebol.

Ressuscitando mortos

Terminadas as eleições municipais de 2008, ficam postas as cartas na mesa para a corrida presidencial de 2010. O PMDB mostrou mais uma vez porque é tão importante no cenário político, apesar de há algum tempo não concorrer à presidência com candidatura própria. Obteve o maior número de prefeituras e importantes capitais, como Salvador, Rio de Janeiro e Porto Alegre. Com isso mais uma vez estará em condição privilegiada para negociar seu apoio nas eleições de 2010. Será cobiçado por todos e assim tará vantagens pós-eleições. O PMDB talvez seja um retrato fiel do Brasil: tão grande, mas insiste em se apequenar, em sair da linha de frente, em não se posicionar. Foi picado pela "mosca azul do poder" e é um dependente crônico agora. Fará a aliança que apresentar maior possibilidade de vitória. O PSDB não apresentou crescimento significativo, mas deu passos importantes rumo à 2010. José Serra mostrou muita força interna ao bancar a candidatura de Kassab, mesmo com Alckmin no páreo. E se deu bem. Enquanto isso, Aécio Neves conseguiu uma improvável aliança entre PT e PSDB, conseguindo eleger um candidato do PSB no segundo turno em Belo Horizonte. Serra sai mais fortalecido, mas Aécio tem a seu favor o fato de não poder mais se reeleger ao governo de MG, enquanto Serra pode tentar a reeleição em SP. Falam de uma chapa com Serra presidente e Aécio de vice, o que acho improvável. Mas Aécio terá de usar toda sua habilidade conciliatória para convencer seu partido. O PT manteve um crescimento, mas o sentimento é de derrota no gral, principalmente por causa de Porto Alegre e São Paulo.Lula não conseguiu transformar sua popularidade em votos aos candidatos petistas. Agora o partido que tinha tudo para ser "extinto" nessas eleições, ressurgiu das cinzas simplesmente com a prefeitura da maior cidade do país: São Paulo. O DEM não obteve nenhuma outra capital e não possui nenhuma liderança nacional. Mas com o apoio de Serra, um programa eleitoral extremamente eficaz, uma rejeição inexplicável da adversária marta Suplicy, produziu-se uma nova liderança do DEM: Gilberto Kassab. O marketing político conseguiu transformar um quase anônimo em um político competente, que "resolve" os problemas da cidade. Junte-se a isso a vocação conservadora e o sentimento "anti-PT" de São Paulo. Pronto, o partido da direita que respirava por aparelhos tem uma súbita melhora e volta a ter força no cenário político. No Rio de Janeiro, outro marketeiro conseguiu produzir um político do nada, a assim Eduardo Paes é eleito prefeito. Mas a maior lição veio de seu opositor, Fernando Gabeira, do PV. Gabeira mostrou que é possível sim fazer política de outra forma. Com uma honestidade e sinceridade incomuns aos políticos, Gabeira foi ao segundo turno e por muito pouco não se elegeu. Com certeza a abstenção recorde de 24% na capital carioca foi determinate para sua derrota. Derrotado nas urnas, mas vitorioso como político, um exemplo a ser seguido de respeito ao eleitor e vontade de melhorar a vida dos cidadãos.

domingo, 26 de outubro de 2008

O tempo (inspirado por um comercial de TV)

3 segundos é pouco quando se faz aquilo que gosta? 3 segundos é muito para um piloto de F1? Falar por 5 minutos é muito? Escutar sua música preferida por 5 minutos é pouco? 15 minutos parece pouco quando seu time vai perdendo a decisão de um campeonato? 15 minutos parecem uma eternidade quando seu time está prestes a se sagrar campeão? 2 horas parecem menos quando se assiste a um bom filme no cinema? 2 horas parecem não ter fim quando se assiste a uma "palestra motivacional" no seu trabalho? 6 horas de sol forte na praia ainda é pouco? 6 horas de chuva torrencial é muito? 1 semana sem ter de olhar para o seu chefe é pouco? 1 semana sem ver a pessoa amada é muito? 1 mês de férias é pouco? 1 mês trabalhando sem parar todos os dias é muito? A 6 meses do fim da faculdade, e com um TCC a ser feito, parece pouco tempo? Ao terminar o primeiro semestre da faculdade, parece que ainda falta muita coisa? Ver seu time ganhar 3 títulos em 1 só ano ainda é pouco? Ver seu time passar 3 anos sem ganhar 1 título sequer parece muito? Uma vida inteira ao lado de quem se ama ainda é pouco? Passar uma vida inteira à procura de alguém é muito? Ah, o tempo...sujeitinho tão temperamental, esse tempo. Ora faz as vezes de carrasco implacável e insensível, ora se mostra o ombro amigo que consola e faz esquecer as tristezas da vida. Dizem que só ele para dar jeito em certas coisas. Mas é ele também quem desgasta relações e as faz ruir. O tempo não perdoa a ninguém, e ainda insiste em nos jogar na cara suas marcas quando nos olhamos no espelho. Pode ser aguardado, desejado, indesejável, inoportuno. Mas ele não se curva a melindres ou favorecimentos. Ele se faz presente, passado e futuro. À todos. O tempo é justo. E por isso talvez seja tão questionado e incompreendido. Inclusive por mim.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Perdendo tempo

Observo a cidade da janela do quarto. Suas luzes, seus ruídos, suas trilhas sonoras, seus comportamentos. Aprisionado às algemas da preguiça, vejo a vida passar à minha volta sem esboçar reação. Penso em inúmeras possibilidades e, calmamente, as vou descartando. Pensar, pensar...sou consumido pela reflexões que me levam a nada fazer. Quantas vezes disse não, querendo dizer sim? Quantas vezes ME disse não, receoso de escutar outro não? A vida é cheia de surpresas, que podemos evitar em troca de um tentador comodismo. Uma simples reflexão pode por tudo a perder. Em certas ocasiões e circunstâncias, pensar demais é um problema. Pensar demais nos traz problemas. Pensar demais nos tira a chance de viver, ou pelo menos de tentar. Mas também às vezes é inevitável não pensar bastante. Nesse caso, torço para que o otimismo de outrora volte a me visitar e me estimule a continuar. Melhor parar por aqui, pois começo a pensar demais e posso desviar a intenção inicial desse texto...Definitivamente, vale à pena pensar menos e agir um pouco mais (um dia ainda chego lá...).

Festa democrática?

A cada 2 anos, é comum ouvirmos nos noticiários frases como "hoje houve mais uma festa da democracia brasileira" ou "o país consolida a cada eleição a democracia". Pois aguardo ansiosamente essa consolidação efetiva da democracia brasileira, que só se INICIARÁ quando tornarmos o voto efetivamente um direito dos cidadãos, ao invés de dever que há tempos o caracteriza. Direito a voto só os jovens de 16 e 17 anos ou os maiores de 70 anos possuem no Brasil. E é normal ouvir por aí que "conquistamos o direito de votar". Ora, no máximo "conquistamos" o dever de votar! Afinal, não sofremos penalizações quando não exercemos nossos direitos, quando abrimos mão deles por alguma razão. Já em relação ao voto, se não cumprimos com essa obrigação, pagamos até multa e ficamos impedidos de algumas atividades, como participar de concursos públicos. A cada eleição, o povo brasileiro vem demonstrando mais maturidade e responsabilidade na hora de votar. É hora de darmos esse significativo passo que é a transformação do voto em direito. Com isso, acredito que até a política possa elevar o seu nível, pois ao invés de campanhas que tentem convencer o eleitor que o candidato A é menos pior que o candidato B, passaríamos a ter candidatos empenhados inicialmente em convencer o eleitor que o voto é importante, ou seja, traria para o debate político a importância do voto, que por sua vez, despertaria o interesse pela coisa pública, pela busca de benefícios à sociedade. Entendo que representaria um salto de qualidade no debate político, ao mesmo tempo que significaria uma inclusão qualitativa da sociedade nessa troca de idéias em benefício da maioria. Já se foi o tempo em que era necessária uma "legitimidade forçada" para referendar governos de práticas duvidosas. A democracia brasileira merece uma festa onde os eleitores sejam convidados, e não convocados!

Cegueira reveladora

Baseado no livro de Jose Saramago, o filme "Ensaio sobre a cegueira", de Fernando Meirelles, é daqueles filmes difíceis de se ficar indiferente. Há quem goste e quem odeie. Apesar de o considerar demasiado fiel à obra literária, ao mesmo tempo em que ameniza situações-limite contidas no livro, considero o filme um dos melhores do ano. A história funciona como uma paródia da realidade: pessoas que não enxergam nada, despreparo dos governantes para lidar com os problemas, indivíduos que buscam em todas as ocasiões levar alguma vantagem e um medo irracional diante daquilo que não se conhece. E no meio desse turbilhão todo, um ser humado sensível aos problemas alheios é "testado" à exaustão. O "ensaio sobre a cegueira" é também um ensaio sobre a solidariedade. A "mulher do médico" é um exemplo de perseverança, de amor primeiro ao seu companheiro, depois aos seus colegas e, na medida do possível, de sensibilidade à extinção gradativa dos traços de humanidade que acompanhamos durante o filme. Seu papel é tão sublime quanto ingrato; tão importante qaunto angustiante; tão esperançoso quanto assustador. É como se "alguém" a tivesse deixado com a visão para que registrasse a desgraça na qual a humanidade pode se meter sem maiores esforços. A mulher do médico é ao mesmo tempo o fio de esperança da humanidade e a retina que apenas testemunha o seu fim. E nesse ponto se encontra a relevância do filme. Podemos enxergar o que está acontecendo à nossa volta, cabe então fazer algo a respeito, não se omitir. Como diz a epígrafe do livro: "se podes olhar, vê. Se poder ver, repara.". Ou ainda uma música do Los Hermanos "é preciso força pra sonhar e perceber que a estrada vai além do que se vê". Sonhar é possível, sonhar é preciso. Ir além do que se vê também.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Recordar é viver (ainda mais para um santista...)

Era um 25 de março que prometia...o ano era 2006. Saímos de casa, eu e um vizinho, para ir ao Pacaembu assitir a Juventus x Santos, a quatro rodadas do fim do Paulistão-06. Chegando lá às 14h00 (o jogo começava às 18h10), a notícia bombástica: não havia mais ingressos nas bilheterias. A primeira coisa que pensei foi "Pqp, não vou conseguir ver esse jogo!". Então meu vizinho decidiu: "vamos comprar de cambista mesmo!". Meia hora depois (e 90 reais a menos na carteira), estávamos dentro do estádio aguardando a partida. O jogo era essencial, pois o Santos tinha 4 pontos de vantagem para o segundo colocado, que era o São Paulo, e ainda faltava o confronto direto, no estádio delas. Era importante manter essa vantagem. Faltando 1 hora para o jogo, o céu desabou sobre nossas cabeças. A torcida inflamada pelo pé d'água gritava sem parar "Santos! Santos! Santos!", como que se implorasse para que o time viesse a campo e começasse logo a partida, mas não teve jeito. Com a bola rolando, o Juventus abre o placar por volta dos 15 minutos. O Santos jogava mal, e parecia que as coisas não dariam certo naquele chuvoso sábado de 2006. Foi então que por volta de 35 minutos do primeiro tempo ainda, em uma cobrança de falta, o alvinegro praiano empatou. A torcida foi ao delírio, pulos e abraços descontrolados. Mas ainda era pouco, faltava um gol. E ele não vinha. A esperança era consumida pouco a pouco pela apreensão. A chuva nem fazia mais efeito agora, a preocupação era tamanha que só aquele retângulo verde lá embaixo importava. Já estava desanimado, fazendo contas para as próximas rodadas na tentativa de manter o otimismo. Foi então que aos 37 minutos do segundo tempo, em um cruzamento despretencioso, o atacante Reinaldo meteu a cabeça na bola e mandou pra rede. Parecia um sonho, custei a acreditar! Nem o jogador mesmo parecia crer no que fez, e saiu chorando na comemoração. Sim! Ele chorou naquele dia, como os mais de 35 mil santistas presentes naquele estádio sob forte chuva. A torcida não se conteve e gritava "é campeão! é campeão! é campeão!". Duas semanas depois, a "profecia" da torcida se confirmaria e, após 22 anos, pude enfim comemorar meu primeiro campeonato paulista. Primeiro sim, mas inesquecível. Principalmente por causa daquele 25 de março de 2006, o dia em que entendi finalmente a diferença entre ver um jogo pela televisão e assistir a uma partida dentro de um estádio de futebol. Ah, e futebol debaixo de chuva é muito mais emocionante para a torcida!